Os países ricos olham para o Hemisfério Sul em busca de soluções para seus próprios problemas
O desequilíbrio global conseguiu se impor, finalmente, na pauta das principais preocupações dos líderes políticos e corporativos reunidos no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. E nem é tão difícil entender a razão: o crescimento do PIB global é puxado, hoje, pelos países emergentes, em especial os chamados BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) enquanto os Estados Unidos e a União Europeia permanecem atormentados por déficits públicos que ameaçam os esforços de escapar a uma estagnação econômica prolongada.
Em outras palavras, as desigualdades regionais só ganharam status quando o nó passou a apertar mais do lado de cima do globo. Pouco mudou na essência do Fórum, que continua a ser um imenso palco para declarações vazias de boas intenções e trocas de cartões nos bastidores. A diferença é que, neste ano, os representantes de países como Brasil, China e Índia são os convidados de honra de banquetes que, também na área diplomática, nunca saem de graça.
A hospitalidade europeia deve-se, por exemplo, ao interesse em negociar meios de conter a escalada de preços das commodities, um fenômeno que levaria ao mundo inteiro a ameaça da inflação. O presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, tem cogitado elevar as taxas de juro na Zona do Euro, em que pesem os efeitos nefastos que o aperto monetário poderia ter sobre as combalidas economias dos países mais endividados da região.
A elevação dos preços agrícolas e da energia não afeta apenas o mundo desenvolvido, e é associada por muitos às graves crises sociais em curso em países como Tunísia e Egito, além de representar uma ameaça a outras regiões, como alertou, em Davos, o presidente da Indonésia, Susilo Yudhoyono. O conselheiro do Fundo Monetário Internacional, Zhu Min, destacou o fato de os alimentos representarem 75% do índice de inflação ao consumidor na Índia, o que torna o país especialmente vulnerável a quaisquer flutuações nos preços internacionais.
A questão é que o encarecimento das commodities não pode ser tratado como uma bolha, como destacam economistas brasileiros. “Não há um movimento especulativo dramático, nem gente tentando acumular estoques. É, sobretudo, o resultado de países emergentes crescendo e consumindo mais, somado a fatores climáticos em países produtores, como a Austrália e a Argentina”, ressalta o professor da USP Simão David Silber.
Ao Brasil, pouco interessa discutir limitações aos preços dos principais produtos de sua pauta de exportação. Não por acaso, a presidenta Dilma Rousseff frustrou expectativas ao se fazer representar em Davos por uma equipe eminentemente técnica, encabeçada pelo ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, ao lado dos presidentes do Banco Central, Alexandre Tombini, e do BNDES, Luciano Coutinho. Antes de chegar à Suíça, o chanceler esteve em Bruxelas, onde foi recebido por altas autoridades da União Europeia, interessadas em negociar um acordo comercial com o Mercosul.
A valorização dos produtos agrícolas e minerais, cara aos europeus, representa para o Brasil não apenas uma fonte de pressões inflacionárias. Foi também a principal razão de o saldo comercial ter se mantido no terreno positivo em 2010, conforme mostra o resultado do balanço de pagamentos, divulgado na terça-feira 25. Uma análise do Itaú Unibanco mostra que o volume médio das exportações subiu 9,5%, enquanto o volume importado disparou 37,8% – mesmo assim, o superávit do comércio exterior foi de 20,3 bilhões de dólares, ante 25,3 bilhões de dólares em 2009. Essa cifra contribuiu para manter financiável o déficit nas contas externas brasileiras, que atingiu 47,5 bilhões de dólares, ou 2,4% do PIB no ano passado.
“Mantidos os termos de troca médios de 2009, o saldo comercial seria deficitário em 8,4 bilhões de dólares e o déficit em transações correntes atingiria 3,7% do PIB. O Brasil está com sorte”, conclui o relatório do banco.
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Por André Siqueira. Foto: Fabrice Cofrini/AFP
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